A revolta dos jovens formará o Egito
Hisham Allam
da IPS News
Traduzido por Natasha Ísis, do Canal Ibase
A juventude dentro da Irmandade Muçulmana pode tornar-se muito difícil de conter na sequência dos assassinatos sangrentos no Cairo, dizem os membros superiores do partido.
O antigo líder da juventude na Irmandade Muçulmana, Haytham Abu Khalil, disse à IPS que a juventude da Irmandade está agora em um estado de raiva, confusão e incerteza. Devido à morte de tantas pessoas, trazer a militância de volta a eles através de campanhas intelectuais e religiosas agora será muito difícil.
– O ataque sangrento que eles sofreram durante os acampamentos levou-os a ver a si mesmos como oprimidos. Eles acham que devem se unir para superar isso – disse Khalil.
Uma consequência será a revolta contra a liderança moderada dentro do partido, disse ele.
– Depois de passar pela situação atual, os jovens membros vão derrubar a liderança atual para restaurar a confiança da comunidade no grupo. Mas eu não esperaria isso a curto prazo.
Deserções para grupos mais militantes são esperadas, disse Khalil, que é autor do livro de ficção Irmãos Reformistas.
– Mas isso vai ocorrer a longo prazo, porque todos agora irão trabalhar para manter a organização. Somos um grupo complicado e não é tão fácil de lidar como os militares pensam.
O perigo mais imediato pode ser a formação de grupos militantes dissidentes, disse ele.
– Eu não descarto a possibilidade de alguns membros irritados formularem grupos armados individualmente, sem referência aos líderes.
Qualquer movimento feito pelos militares para proibir os partidos políticos com base na religião só iria conduzir os membros a grupos islâmicos radicais que, então, adotariam ideias de extremismo jihadista, alertou.Para o doutor Amr Hashem Rabie, chefe do departamento de Estudos Egípcios no Centro Al-Ahram de Estudos Políticos e Estratégicos, uma tendência pode surgir dentro do grupo para livrar-se do princípio estabelecido de obediência. Tal passo criaria um desequilíbrio dentro da Irmandade, porque certamente atrairia muitos jovens.
– A juventude sente agora que foi jogada em um confronto sangrento. Aqueles que rejeitam a liderança atual vão abandonar a Irmandade e, ou parar o trabalho político, ou participar de milícias armadas, como a Jihad Salafista.
Rabie disse que líderes da Irmandade querem um papel político para o partido, e não gostariam de voltar à escuridão novamente. Mas, disse ele, “a voz dos neo-reformistas vai se levantará de dentro.”
O futuro da própria Irmandade Muçulmana está em jogo após o assassinato em massa no Cairo e os confrontos sangrentos durante uma manifestação pacífica para exigir a volta de Mohamed Mursi, presidente retirado pelos militares.
Muitos analistas políticos acreditam que o futuro da Irmandade Muçulmana será determinado pelos jovens, muitos dos quais têm recorrido à violência para combater o que eles vêem como perseguição religiosa.
O analista político Dr. Wahid Abd-al-Majid, disse que a repressão dos militares está se transformando em um confronto entre exército e polícia, por um lado, e uma Irmandade Muçulmana cada vez mais armada do outro.
Em face da repressão sangrenta dos militares, Abd-al-Majid apontou que também houve violência por parte de uma facção armada dentro da Irmandade Muçulmana. Dois campos divergentes estão surgindo dentro do partido, contou à IPS.
– Tenho informações de que existem alguns líderes sênior dentro da Irmandade que rejeitam o método de escalada do grupo que liderou a manifestação – comentou, acrescentando que foram instruídos a não mostrar isso.
Abd-al-Majid, disse que alguns grupos armados, liderados por jovens membros que acreditam que a mudança só virá através da violência e do jihad, já surgiram fora da Irmandade e foram ganhando força. “Eles matariam pela Irmandade e em nome de Allah e do Islã.”
A juventude da Irmandade está se dividindo desde a revolução de 25 de janeiro, diz Abd-al-Majid. Um lado tem formado grupos pacíficos, como os “Irmãos sem violência” e “Livre irmãos”. Alguns se reuniram em torno de líderes dissidentes da Irmandade ou se uniram a partidos políticos como o al-Wasat e Masr al-Qaweya. Mas estes são grupos relativamente pequenos.
No entanto, o grupo militante da Irmandade é mais dominante, diz ele. Eles estão imersos em uma ideologia de plena obediência aos líderes partidários – no presente. Líderes reformistas dentro da Irmandade agora lutarão para mudar a estratégia de motivar a juventude para a oposição agressiva.
– Eles estão usando a juventude como um combustível para a violência e irão abandoná-los no primeiro obstáculo – prevê Abd-al-Majid.
Os jovens não receberam papéis de responsabilidade dentro do partido. Eles não estavam representados, por exemplo, no âmbito do Conselho Shura, disse ele. Isso só pode aprofundar divisões entre os líderes partidários moderados e uma juventude cada vez mais militante dentro do grupo.