Por um Projeto Político Autônomo das Favelas
por Fransérgio Goulart, Assessor Político do Centro dos Direitos Humanos de Nova Iguaçu, Militante do Fórum Social de Manguinhos, Historiador, Favelado, Assessor para Cartografias Insurgentes, apoiador dos Movimentos: Rede de Comunidades e Movimento Contra à Violência, Mães de Manguinhos e Mães de Maio
Estava desde a última sexta, 22 de setembro, para escrever algo sobre a invasão da Rocinha e outras favelas, mas confesso que não consegui. Escrever sobre o que? Sobre o racismo? Sobre o espetáculo midiático da guerra criada pelos grandes veículos de comunicação? Sobre a guerra contra nós faveladas e favelados, negras e negros, sobre a guerra contra nós, os pobres? Ou escrever sobre as invasões de casas pela Polícia e o exército na Rocinha? Falar sobre o Judiciário racista, sobre o rapaz 157,que depois será o 158,159 …..? Eu e algumas centenas de faveladas e favelados estamos, há mais de uma década vivendo essa guerra – e antes de nós (os mais velhos) já falavam e escreviam sobre isso – e as coisas só pioram. A sociedade, de uma forma geral, grita por mais Polícia, por mais tanques, por mais guerra contra nós. O discurso e práticas fascistas avançam. A sociedade está militarizada e doente e nós também. O campo dito da esquerda (Boa parte das ONGs e dos partidos) trabalha com nossa dor pensando em lógicas de manutenção de captação de recursos e o projeto pessoal de chegada ao poder via eleições. Ou seja, somos mortos pela direita e pela esquerda. O que fazer se todas ou quase todas as nossas estratégias nos trazem muito pouco? Talvez a hora seja de refletirmos sobre tudo isso. Tudo que já existe, testamos e experimentamos enquanto o genocídio só se potencializa.
Podemos ter como horizonte alguns tipos de mobilização com ações diretas, como fazem os indígenas, ou até aquilombarmos em nossas favelas. Podemos utilizar algumas dessas estratégias nas emergências, mas temos que construir um projeto político novo, emancipador e libertador, pois, se não, continuaremos diariamente enterrando os nossos e nossas permaneceremos adoecendo. O desenvolvimento deste projeto é para médio e longo prazo, mas temos que começar. Talvez, aliás, já estejamos até construindo.
De positivo, o que podemos dizer é: que sofremos juntxs e que nos cuidamos mutuamente para ainda continuarmos vivos e lutando. E tendo Mães e Familiares Vítimas desse Estado e um monte de faveladxs como inspiração. #NósporNós