Relatos de uma guerra particular (o olhar de quem mora)
Cosme Fellipsen”o Favelado”

Cosme Felippsen “o Favelado” (Foto: Pedro Martins/Canal Ibase)
Sou nascido e criado na primeira Favela do país, a Providência. Quando criança minha mãe sempre me orientava: -Filho, aqui você não viu nada, não ouviu nada e não sabe de nada.
Será que estamos numa guerra? Sim, estamos. Só fui perceber isso mais tarde. Somos reféns desse Estado! Pois a Favela não produz armas. Ou temos fábricas de fuzis, HK, ponto-30, AR-15, bazuca, metralhadoras, pistola, três oitão na Favela? De onde saem essas armas? Quem facilita a entrada delas? Quem as vende?
Em 2010 o Morro da Providência recebeu a sétima UPP do Rio de Janeiro. Ano que meu irmão PAULO VINICIUS FELIPPSEN CORTÊS foi morto pela PMERJ com seus 17 anos. Um comentarista insistia na TV que onde chegava a UPP o índice de mortalidade por arma de fogo caía a zero. Mas, nós faveladxs sabemos que não.
Desde criança eu vejo o Estado entrar na Favela de mão armada na figura de um policial fardado. Será que é só de polícia que precisamos? Será que precisamos dessa polícia? Quem policia a polícia?
Hoje temos dentro da Favela uma sede da UPP com 200 policiais. Mas não temos uma escola dentro da Favela. Não temos um posto de saúde dentro da Favela. Não temos um equipamento de cultura do governo. É só de polícia mesmo que precisamos? Aqui temos realmente o Estado mínimo! Ou seria Máximo?
Se, ao invés de 200 policiais efetivos, tivéssemos professores e médicos… Ai meu Deus! Talvez a Violência poderia diminuir. Teríamos mais educação. A educação é libertária!
Aos que pensam que a ditadura acabou, aqui na Favela não. Somos invadidxs pelos militares. Torturadxs, roubadxs, silenciadxs e assasinadxs.
O DOPS, trajado em outras siglas (Core, Bope…),ainda circula pela Favela.
É, irmãos e irmãs, o que fazer diante disso tudo?!
Eu acredito fielmente na nossa força, na nossa união. Parece não ter solução, porém, não podemos estagnar. Podemos morrer na guerra e se for para morrer lutando, morreremos! Acredito fielmente em lutas tão simples, porém de uma importância tão grande, como: o Pré-vestibular Machado de Assis, que tem colocado o faveladx na universidade. O Cine Clube Revolucionário do Morro da Providência, que tem nos alimentado de informações para a luta.
O Fórum de Juventudes do Rio de Janeiro que faz essa interação duma juventude pretx, pobre, periférica e favelada.